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COLUNAS

Estamos diante de uma nova ordem mundial pós-americana?

Publicado em: 19/04/2019 10:25

As ordens mundiais, ao se formarem e se dissolverem, trazem mudanças no tabuleiro de xadrez da política internacional. Não é nada diferente com a atual ordem mundial centrada nos EUA com toda a sua carga de potência no mundo. Toda ordem mundial acarreta emergência de novos atores, declínio de alguns velhos mandarins da política internacional, bem como algumas transformações na lógica de acumulação, nos processos tecnológicos e de relações militares entre os países. Toda ordem mundial é atrelada à governança mundial de um determinado momento histórico acarreta mudanças no padrão de comportamento dos Estados e dos demais atores internacionais. Cada ordem mundial possui suas especificidades, seus padrões de controle e de determinação da lealdade entre os atores estatais, não estatais e individuais. 

Com efeito, o sistema internacional pós-Guerra Fria (pós-bipolaridade) apresenta como principal característica a dinamicidade das relações entre os Estados soberanos e uma série de atores não estatais, como as Grandes Corporações Transnacionais (GCT), as ONGs e os indivíduos, decorrente do atual processo de regionalização e globalização. Tais processos complexos são resultantes da constante integração e fragmentação do contexto contemporâneo e pós-moderno. Diante dessa conjuntura, ao mesmo tempo conflituosa e cooperativa, as normas internacionais refletem sua fragilidade ou mesmo incapacidade de acompanhar o poder hegemônico dos países centrais, especialmente os EUA, causando instabilidades, assimetrias e dispersões das mais diversas. Toda renovação ou alteração da ordem mundial, especialmente no que tange ao paradigma de relativização do estatocentrismo na alvorada do século XXI, implica partilha de responsabilidades, análise dos custos e benefícios bem como arranjos decisórios aceitos pela maioria dos Estados participantes.

Não podemos esquecer que o cenário internacional do século XXI ainda é baseado em uma ordem americanocêntrica, como já externado anteriormente. Ou seja, os EUA ainda ocupam, de maneira unimultipolar (Huntington), o pináculo da distribuição de poder mundial. Ao vencerem a Guerra Fria (1945-1991), os EUA construíram a presente ordem mundial baseada em seus valores e seus conteúdos de poder simbólico e factual. Isto não é permanente; nem tampouco deve ser considerado como imune a futuras contestações – algo que já deve estar acontecendo por parte de novos polos de poder emergente na Ásia-Pacífico como também da região da Eurásia. 

A pergunta que permanece é: até quando a ordem mundial unipolar, centrada nos EUA, estará vigente? Perguntaria mais: como os EUA conseguirão manter a união entre o hard e o soft power neste mundo em crise e transformação? Sobre a primeira pergunta, temos de entender quais são as dinâmicas e a natureza nesta segunda década do século XXI. Percebemos que, atualmente, a manutenção do patamar hegemônica não se sustenta com as mesmas condicionantes existentes no distante século XX. Há um novo quadro difuso, complexo e assimétrico de poderes interrelacionados que constroem e destroem, ao mesmo tempo, esse bravo novo mundo. Esse novo quadro afeta uma redução do poder hegemônico relativo dos EUA diante de novos contestadores, a saber: China e Rússia. Além disso, existem os países considerados como contrários à manutenção do status quo, como Coreia do Norte e Irã, e que, nesta condição, afeta a estabilidade inteira do sistema internacional. Crises serão cada vez mais frequentes neste povir dos tempos de mudança estrutural na ordem mundial sino-americana em gestação, tendo a Rússia, a UE e a Índia como novos coeficientes de encaixe com suas polaridades regionais.  

Em outras palavras, estamos diante de um mundo que, em breve, deve ter novo condomínio compartilhado de poder hegemônico entre os EUA e outros países. A guerra comercial entre EUA e China já é um claro sinal destes tempos de contestação e rivalidade latente. Vejo instabilidades e crescentes apegos às armadilhas de poder no horizonte próximo, revelando a repetição natural das dinâmicas internacionais desde séculos e séculos. Esperemos que tal transição ocorra de maneira suave e menos sangrenta, respeito os primados da lei e da moral internacionais, construindo consensos mínimos na comunidade das nações.
 
*Thales é cientista político e professor 
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