Economia

Custo de vida em alta, renda per capita em baixa

Pernambucanos da região metropolitana lidam com o paradoxo de viver com os custos de uma área urbana e uma das rendas médias mais baixas do país

Na última semana, o censo do IBGE apontou que a renda per capita domiciliar de Pernambuco é a quarta mais baixa do país, contabilizada em R$ 1.113 (frente ao valor médio nacional de R$ 1.893). Um parâmetro que chama atenção quando, no mesmo contexto econômico, há um custo de vida tão alto na capital do estado. Um exemplo: no início de 2024, o Recife tinha o terceiro metro quadrado mais caro do país para locação.

O custo da alimentação também onera a renda familiar. Segundo o Dieese, no último mês de janeiro, o valor médio da cesta básica no Recife foi de R$ 550,51, correspondendo a mais de 42% do salário mínimo, de R$ 1.412.

Marta é técnica de enfermagem em Palmares (PE): renda não cobre todas as despesas da família

“Não sobra dinheiro”, conta a técnica de enfermagem Marta Maria da Silva, de 47 anos. Ela mora em Sirinhaém e trabalha no Hospital de Palmares e mesmo vivendo fora da região metropolitana, não dá conta do custo de vida. “Tenho um filho de 20 anos que não trabalha e cuido da minha neta. Tenho que escolher entre lazer e comida e nem dá pra variar, comprar algo diferente como um queijo”, relata. Para tentar cobrir as despesas, Marta recorre ao cartão de crédito. “Todo mês escolho o que vou pagar e vou empurrando o resto”, diz. Segundo o Instituto Locomotiva, 60% das dívidas dos brasileiros são no cartão.

A auxiliar de produção Rosimere Nascimento vive a mesma situação. “Recorro à família, meu salário não cobre. Se tivesse filhos, estava passando fome”, diz. Já o enfermeiro Mateus dos Santos vive em Barreiros e trabalha no Recife. Apenas desse esforço, o salário não é suficiente. “Atualmente sou professor do ensino técnico e complemento a renda dando apoio a artigos científicos. Sem o bico, não consigo”.

O enfermeiro Mateus dá aulas, mas precisa complementar a renda todos os meses

CUSTO DE VIDA
São nos grandes conglomerados urbanos onde estão os maiores custos de vida. Na Região Metropolitana do Recife (RMR) vivem em torno de 1,5 milhão de pessoas e viver em áreas urbanizadas exige custos inerentes ao formato, como o transportes e o valor de aluguéis imobiliários em bairros mais procurados. Falando nisso, o economista e professor da Uninassau Sandro Prado explica que a demanda por moradia não para e como se trata de um dos metros quadrados mais caros do país, vive-se um paradoxo.

“A realidade é renda menor por membro da família e uma dificuldade grande para essas pessoas terem o básico. Os cursos são muito elevados. Em Brasília, por exemplo, o custo de vida é alto, mas a renda também é maior. No Recife, temos um custo elevado, um dos mais elevados, e esse paradoxo de uma renda per capita mais baixa. Uma discrepância muito grande. A classe médica quase não existe em Pernambuco: ou são pessoas que têm dinheiro ou muito empobrecidas”, analisa.

Prado chama atenção para a desigualdade social do Recife e de sua região metropolitana. Os grandes prédios da orla de Boa Viagem são uma realidade distante mas a apenas três quarteirões de comunidades em situação de pobreza. “Em casos assim, o poder público precisa ter mais condições de oferecer serviços. Saúde, educação, subsídios ao transporte, lazer acessível. Se você ganha menos, o estado precisa suprir. Quando se ganha mais, deixa de depender”.

CÁLCULOS
Para dar suporte às pessoas de baixa renda, as políticas de transferência de renda são essenciais - e elas entram no cálculo da renda per capita feito pelo censo do IBGE. Assim, Bolsa Família e outras possibilidades de assistência como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) são adicionados à soma.

“Tudo isso entra como renda. Se não fossem eles, seria ainda pior. Há uma ‘guerra’ entre os estados porque o Norte e o Nordeste demandam mais assistência. É um assunto sempre debatido. Mas somos uma região empobrecida que precisa mais da presença do estado”, defende.

COMIDA NA MESA
Um dos pontos que encarece ou barateia o custo de vida de uma família no Brasil é o percentual destinado à alimentação. Como disse Marta, no início desta matéria, se for para priorizar, a comida vem em primeiro lugar. Mas se o alimento não tem produção local, ele fica mais caro ao consumidor final; se é produzido aqui, chega mais barato. O tomate e o ovo são exemplos, respectivamente. O ovo de Pernambuco é um dos mais baratos do país porque o estado tem uma produção que atende à sua demanda local.

Segundo o economista, Pernambuco tem a vantagem de ser um estado bem localizado geograficamente e dispor de portos, o que torna o estado interessante para empresas que visam o mercado externo.

“Mas quando você vai ver o mercado interno, a configuração muda. Quanto mais empobrecida é a população, menos interesse as empresas têm de investir, principalmente as do ramo varejista. Afinal, é uma população com pouco poder de renda”, pontua. E tentando reverter esse cenário, a lógica tem sido a cessão de incentivos tributários para tornar o estado mais competitivo.

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