Tragédias climáticas em Pernambuco e no Brasil: falta de infraestrutura e ação preventiva

Roberto Quental Coutinho
Professor Doutor - UFPE, presidente da Cobrae 2022, VIII Conferência Brasileira Sobre Estabilidade de Encostas

Publicado em: 09/11/2022 03:00 Atualizado em:

Nós tivemos, este ano, particularmente em maio, um dos maiores desastres no nosso estado e particularmente na Região Metropolitana do Recife. Nós temos uma condição geográfica e de relevo muito peculiares. Temos uma planície que é, digamos, ocupada de forma adequada, mas com cotas muito baixas, com presença de solos moles, muito aterro e três rios que a cortam. Temos morros que contornam toda essa planície, com cotas em torno de até 100 metros. Um ponto peculiar que existe também em outras cidades brasileiras são as questões sociais importantes, gerando uma ocupação de forma desordenada, não técnica, e com características onde há fatores antrópicos muito significativos. Quando se integra tudo isso, uma geologia e um relevo não tão problemáticos como, por exemplo, da região serrana do Rio de Janeiro, mas que tem suas características próprias, tal como o processo de erosão, que ocorre naturalmente e alguns tipos de deslizamento também, são bastante ampliados e em grande quantidade pela forma de ocupação dessas áreas.

Nós temos mais de 1 milhão de pessoas ocupando essas áreas em torno da RMR. Este ano, tivemos tudo ao mesmo tempo: processos de erosão, deslizamento, alagamento e inundação de rios, tanto os que cortam diretamente a RMR como os próximos à nossa região. Tivemos uma quantidade de chuva totalmente anormal. O mês de maio ultrapassou mais de 700 milímetros de precipitação. Na última semana, de 23 a 29 de maio, em Jaboatão, tivemos 528 mm e, em um único dia, 205 mm. Em 28/05, quando aconteceram os maiores acidentes, em oito horas, tivemos 173 milímetros e, em uma hora, 52 milímetros. Realmente, uma chuva extremamente intensa. Também foi prejudicada a infraestrutura, como rodovias, algumas pontes e inundações em cidades próximas, barragem chegando a seu nível máximo.

Pernambuco é o 4º estado brasileiro com maiores registros de mortes relacionadas a deslizamentos de encostas no Brasil no período de 1988 a 2022. Outros estados, como Rio de Janeiro (1º), São Paulo (2º) e Minas Gerais (3º) são exemplos de locais bastante afetados por esse tipo de desastre.

Observamos um ponto muito importante que hoje é uma discussão mundial, a questão das mudanças climáticas. Os acontecimentos deste ano deixaram claro que é momento de unir todas as forças e precisamos de integração dos governos federal, estaduais e municipais, junto às defesas civis, outros órgãos técnicos e à sociedade e, claro, à comunidade técnica, como as universidades e a Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica - ABMS, que, através de um evento nacional no Hotel Armação, em Porto de Galinhas, de 23 a 26 deste mês, vem somar esforços para discussão e apresentação de possíveis soluções.

A Cobrae é uma conferência tradicional da ABMS, ocorre a cada 4 anos e já tem mais de 30 anos em edições. Esse evento busca trazer contribuições na forma de minicursos, palestras, com pessoas de renome nacional e internacional, artigos científicos, debates, além da conferência Willy Alvarenga Lacerda, que será proferida pelo professor Leonardo Cascini, da Universidade de Salerno - Itália. Os temas debatidos serão nas áreas de Movimentos de Massa em Encostas, Investigações Geológico-geotécnicas, Mapeamento Geotécnico e Gestão de Riscos, Comportamento de Taludes e Aterros, Soluções de Engenharia, Instrumentação e Monitoramento e Taludes Submarinos e de Mineração. O público-alvo inclui pesquisadores e profissionais, estudantes de graduação e pós-graduação de engenharia civil, geologia, mineração, geógrafos e técnicos das defesas civis. Serão dias de intensidade científica, troca de experiências e convívio social, além da oportunidade de desfrutar Pernambuco com suas cores, sabores e aromas.

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