A esquerda e o equilíbrio fiscal

Alexandre Rands Barros
Economista

Publicado em: 25/06/2024 03:00 Atualizado em: 25/06/2024 00:05

Ao longo dessa semana algumas pessoas de esquerda engajadas no governo federal, finalmente, perceberam que equilíbrio orçamentário deve ser uma das maiores preocupações do governo, sobretudo quando a dívida e o desequilíbrio chegam à situação que temos atualmente no Brasil. As ações do governo para equilibrar o orçamento estão tentando reduzi-lo apenas com diminuição das distorções no sistema tributário e dos chamados gastos tributários, que são cessão de receitas para setores específicos com vistas a fomentá-los. Essas estratégias cada vez mais perdem eficácia e credibilidade. As consequências têm sido depreciação da taxa de câmbio e aumento dos juros futuros. O governo está percebendo que vai precisar mexer também nos gastos.

No livro ‘A Esquerda Hoje’, mostro que o déficit público sem controle, que gera inflação, é uma estratégia contrária aos princípios da esquerda. A inflação concentra renda e os gastos excessivos tendem a transferir recursos para segmentos mais ricos da sociedade. Ou seja, o recurso a déficit público, sendo crônico e não circunstancial, não é uma política de esquerda. Infelizmente, alguns segmentos da sociedade brasileira que querem ser de esquerda ainda não perceberam isso e juntam suas vozes a setores com interesses corporativos específicos. Com isso, o país continua a enfrentar uma dificuldade em controlar o déficit público e promover o desenvolvimento e melhoria da distribuição de renda.

A esquerda deveria estar discutindo os gastos públicos que têm que ser cortados. A pressão da direita é para cortar gastos sociais, concentrando suas pressões na redução do Benefício de Prestação Continuada e na desvinculação dos gastos de saúde e educação das receitas. A esquerda deveria estar contra-atacando com sugestões de redução nos gastos militares e nos subsídios aos grandes produtores rurais e outros segmentos empresariais. Por exemplo, se somarmos os salários dos militares, aos das aposentadorias (reformas e pensões) e aos gastos discricionários com defesa, já se atingiu 1% do PIB em 2023. Caso se corte 50% desses gastos, além de já se colocar o governo central em superávit, ainda deverá se ter menos problemas com conspirações contra o poder civil, como se viu recentemente, e até mesmo, provavelmente, menos violência, pois o ócio dos jovens é uma fonte de violência, segundo estudos psicológicos.

No item Subsídios, Subvenções e Proagro, destinado ao setor agropecuário, há mais de 0,1% do PIB que representa subsídios aos grandes produtores. Pode se cortar esses itens também, pois eles são altamente concentradores de renda. Caso se corte metade do item Legislativo, Judiciário, MPU e DPU, do orçamento federal, também se reduz a ociosidade e gastos exagerados, trazendo esses órgãos para entregarem uma parcela de sacrifício. Isso daria uma economia de mais 0,1%, segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional para 2023. Na soma, aí já haveria uma redução de 0,6% dos gastos, suficiente para gerar superávit. Cortando-se 10% dos gastos com funcionários civis, se consegue uma redução de 0,14%, segundo a mesma fonte de dados. Se metade das emendas dos deputados e senadores forem cortadas também, o país teria uma redução de mais de 0,75% do PIB. Certamente, esses cortes poderiam reduzir a taxa de juros e permitir que o PIB do país volte a crescer a taxas elevadas. A amplíssima maioria dos brasileiros estaria bem melhor no prazo de menos de cinco anos, principalmente os mais pobres.

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