A nossa realidade

Sérgio Ricardo Araújo Rodrigues
Advogado e Professor Universitário

Publicado em: 05/07/2024 03:00 Atualizado em: 05/07/2024 07:29

Em algumas caminhadas que faço corriqueiramente, enquanto vou e volto do trabalho, que para mim são tão preciosas, me deparo pensando sobre as belezas e dificuldades de minha vida na essência de sua realidade.

Em alguns momentos tenho que tomar decisões difíceis ou suportar fatos que, por alguns instantes parecem ser insuportáveis e que preferiria estar fora da realidade, mas não ajudaria a viver e aprender com a vida.

Em outros momentos lembro de cada cena que me trouxe alegria e gozo e me deparo sorrindo sozinho.

Lembro de uma cena emblemática do filme Matrix, onde é oferecida ao personagem duas pílulas, uma da realidade e outra de um mundo virtual inexistente, criado pela tecnologia, sendo o mundo virtual mais aprazível que o real.

No ensaio O mal-estar na cultura o criador da psicanálise, Sigmund Freud, traz uma reflexão sobre a dificuldade de alcançar a harmonia entre a felicidade e as demandas do dia a dia.

O autor defendia que “é impossível enfrentar a realidade o tempo todo sem nenhum mecanismo de fuga” e, segundo ele, existem três caminhos de compensação adotados pelo indivíduo, como forma de aliviar o sofrimento causado por esse conflito, que são: distrações, satisfações substitutivas e entorpecentes.

O ser humano, desde a antiguidade, sempre buscou formas de escape da realidade. Hoje, além das bebidas e drogas, desenvolvemos novas formas de entorpecer a nossa mente através do aparato tecnológico.

Mas do que queremos escapar? Da dor? Do sofrimento? Da nossa vida miserável? Ou de nós mesmos?

Quando ando pelos grandes centros urbanos no Brasil me deparo com milhares de zumbis, dependentes químicos de crack e outras substâncias que destroem a cada dia que passa mais pessoas.

Esses locais foram até apelidados de crackolândias, como se fossem mundos paralelos à realidade urbana.

Tudo isso está fora de controle das autoridades, que tentam realizar atos paliativos em tais localidades, quando fazem algo.

Recentemente veio à mídia toda uma discussão sobre o uso recreativo de drogas que se passou no Supremo Tribunal Federal e, ainda foi noticiado que uma personagem artística havia falecido pelo uso da Cetamina.

Djidja Cardoso, ex-sinhazinha do Garantido foi encontrada morta pelo uso de tal substancia em uma espécie de ritual com um grupo de familiares e outras pessoas.

O fármaco é considerado um anestésico dissociativo, isto é, que causa efeitos alucinógenos, sensação de bem-estar e tem potencial sedativo quando usado como droga recreativa.

O primeiro caso da utilização da cetamina como droga (ou seja, para fins recreativos) foi registrado nos anos 1970, nos Estados Unidos. Na década de 1990, o uso se disseminou no Reino Unido, especialmente em clubes noturnos e festas conhecidas como raves.

No Brasil, o tráfico utiliza essa substância para produzir uma droga sintética traficada com o nome de “special k”, “Key”, “Keyla” ou “Keta”.

A família, o lazer, os estudos, a leitura estão sendo relevados a um segundo plano frente a busca do entorpecimento e creio que teremos pessoas cada vez com “menos almas” ou capazes de enfrentar a vida, criando vidas inexistentes, ou existentes apenas virtualmente, como tivessem desistindo da que é real.

Crianças e adolescentes desejam se entorpecer em um mundo virtual paralelo, onde criam personagens que se orgulhem mais do que acham que são.

Adultos se entorpecem sozinhos com álcool e outras substancias, ou em grupo, para tentar viver um personagem que não são de fato, mas que parecem ser mais interessantes do que acham que são.

A realidade está sendo abandonada e estamos vivendo um mundo tenebroso, precisamos enfrentar esse mundo, essas dificuldades e não nos arrepender depois de não termos vivido e perdido nossa almas, nossas essências.

Deixo a letra Epitáfio dos Titãs:

Devia ter amado mais
Ter chorado mais
Ter visto o Sol nascer
Devia ter arriscado mais
E até errado mais
Ter feito o que eu queria fazer

Queria ter aceitado
As pessoas como elas são
Cada um sabe a alegria
E a dor que traz no coração

O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar distraído
O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar


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