Pinte sua aldeia

Aldo Paes Barreto
Jornalista

Publicado em: 20/09/2024 03:00 Atualizado em: 20/09/2024 05:25

O escritor russo Leon Tolstoi foi um homem notável, excepcional. No viver, no escrever e no que ensinou. Pacifista, humanista, combateu a violência em todas as frentes, fez o que pode para melhorar o comportamento humano. Deixou obra imensa, extensa, virtuosa e atual: “Se queres ser universal, comece por pintar tua aldeia”, ensinou.

Há muitas maneiras de pintar nossa aldeia, galgar o mundo, ter a humildade de exaltar nossas origens, nosso berço. O jornalista Antônio Maria, por exemplo, usou o frevo, a mais pernambucana das nossas manifestações musicais, para enaltecer a alegria de ser recifense. Tinha orgulho daquela gente que ficou por lá. O médico e compositor sertanejo Zé Dantas percorreu longo caminho, a partir do Pajeú, para cantar o sertão enquanto Dominguinhos evocava a alegria da volta aos seus pagos, ao seu aconchego.

Mais práticos, alguns empreendedores voltaram às origens, irrigaram o terreno árido, exaltaram a perseverança. Determinados, um dia partiram em busca da sobrevivência, mas sempre voltaram trazendo o matulão carregado dos melhores e mais nobres exemplos. Aprenderam e ensinaram a pintar e a pescar.

O sergipano João Carlos Paes Mendonça, está fazendo assim na Serra dos Machado, dos seus antepassados. Empreendedor, vencedor, plenamente realizado, volta sempre às origens para iluminar sua aldeia com as luzes do ensino, pintar o futuro dos conterrâneos com as cores do arco-íris. As cores da esperança.

O pernambucano de Taquaritinga do Norte, Severino Pereira da Silva, não apenas pintou sua aldeia, mas ergueu paredes, cobriu o teto dos mais humildes, construiu escolas, hospital e deixou uma herança de como plantar, colhe, trabalhar e tornar possível a realização dos sonhos dos mais humildes.

Adolescente, Severino começou a trabalhar lá mesmo em Taquaritinga ajudando à família. Viajou, buscou outras terras e obteve o mais amplo sucesso na indústria têxtil, no Rio de Janeiro e em São Paulo.  Tornou-se empreendedor bem-sucedido na indústria têxtil nacional.  Em 1935, comprou pequena tecelagem no Rio de Janeiro. Cresceu e não parou mais. Enfrentou a recessão mundial, a quebra da Bolsa de Nova Iorque, a debacle do algodão, as pragas e o surgimento do fio sintético.

Em todos os momentos, em cada um daqueles anos jamais deixou de voltar a Taquaritinga, rever parentes e amigos, de trazer a mala carregada de ideiase de ensinamentos. Naquela época, início dos anos 1950, o fio sintético chegava ao Brasil e dominava o mercado. A helanca liderava as vendas e as criações têxteis. Mas, tinha um problema. Quando uma ponta do fio soltava, só mãos habilidosas poderiam recuperar a meada e o fio. Do contrário, a peça estava perdida.

O industrial pernambucano descobriu o ponto fraco e idealizou uma solução incentivando os conterrâneos a comprarem nas indústrias do Sul, as peças defeituosas, os retalhos, as pontas de estoque para revender nas feiras do Nordeste. Foi um sucesso. Nas feiras de Taquaritinga, Caruaru, Santa Cruz do Capibaribe, a helanca trazida do Sul, transformou-se na sulanca, e deu nome às feiras. Hoje a atividade tornou-se cenário do maior polo de vendas têxteis do País.

Na cidadezinha onde nasceu “seu” Pereira tudo tem uma realização, pedaço das lembradas do benemérito.Severino Pereira da Silva pintou, bordou sua aldeia e transformou em realidade um fio de esperança dos conterrâneos.

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