Politica

Melhorar a educação será um dos maiores desafios do próximo presidente

Especialistas dizem que melhorar a qualidade do ensino no país é fundamental para reduzir as desigualdades sociais e promover o crescimento econômico


Uma das grandes preocupações, e tema da primeira reportagem, é a situação educacional do Brasil. Embora o país registre alguns avanços — como o aumento no número de crianças de quatro a 17 anos nas escolas, faixa na qual a taxa de atendimento subiu de 48% para 94,2% desde 1970 —, situações como atraso na aprendizagem, abandono escolar e incompatibilidade com boas práticas internacionais parecem não ter solução. Na visão de especialistas ouvidos pelo Correio, qualquer presidente que assumir em 2019 precisará priorizar o tema, com a noção de que ignorá-lo significa dar um passo em direção à estagnação social e econômica do país.

O assunto deve ser tratado com firmeza não só pelos candidatos mais inclinados a pautas sociais, mas também pelos que se dizem focados em questões econômicas (veja abaixo o que dizem os presidenciáveis). “Não é o caso de discutir se o problema maior é de falta de dinheiro ou de gestão, porque é um acúmulo dos dois. Não adianta ter orçamento e não saber usar, assim como de nada serve um gestor eficiente sem condições de fazer nada. Os dois lados precisam de atenção”, pondera a pedagoga Anna Helena Altenfelder, presidente do Conselho de Administração do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec).

Sozinhos, discurso político e injeção de recursos não resolvem os problemas, como explica o presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Abilio Baeta Neves. “Apenas aumentar recursos, mas continuar fazendo o que estamos fazendo é aumentar o tamanho do erro”, afirma. Resta saber o que o próximo presidente pode (e está disposto a) fazer para não cair no erro de apenas construir escolas, sem se preocupar com o que acontece dentro ou nos arredores delas. 

Ensino acelera aumento do PIB

Inúmeros fatores contribuem para que uma nação seja mais desenvolvida que outra. Nessa extensa lista está, em lugar de destaque, a qualidade da educação, que explica grande parte da diferença entre as taxas de crescimento de longo prazo dos países. Estudo feito pelos pesquisadores norte-americanos Eric A. Hanushek e Ludger Woessmann mostra que um aumento de 100 pontos no resultado médio de um país no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA, na sigla em inglês) está associado a dois pontos percentuais a mais na taxa de crescimento anual média do Produto Interno Bruto (PIB) per capita dele. Significa dizer o que, para muitos, é óbvio: quanto mais se investe em educação, maior o potencial de crescimento da economia.

Para um país que ainda pena para se recuperar de uma longa crise econômica, como o Brasil, perceber isso é essencial. “Se não for levar em consideração o direito à aprendizagem das crianças e adolescentes, pelo menos os candidatos precisam olhar para o que vai acontecer com o país se a qualidade da educação não melhorar. Ele vai deixar de crescer”, alerta a professora Cláudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getulio Vargas (CEIPE-FGV) e ex-Secretária Municipal de Educação do Rio de Janeiro.

Diante do cenário ainda longe do ideal, o movimento sem vínculos político-partidários Todos pela Educação elaborou um documento com sete pontos principais para orientar os candidatos na proposição de melhores políticas públicas educacionais. A lista, que já foi apresentada a equipes de oito presidenciáveis, inclui a criação de uma política nacional de valorização dos professores, o aprimoramento da política nacional de alfabetização na idade certa, a criação de um sistema nacional de educação e mudanças legais no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), para torná-lo permanente.

Para o grupo, o principal desafio da educação básica brasileira, hoje, é aumentar o nível de aprendizagem dos alunos. De acordo com dados da instituição, de 100 crianças que entram na escola, só 59 concluem o ensino médio. Das que conseguem terminar essa etapa, 27,5% têm aprendizagem adequada em português e só 7,3% aprendem o que deveriam em matemática. As políticas públicas adotadas pela próxima gestão também devem levar em consideração o fato de que 55% das crianças, ao final do terceiro ano do ensino fundamental, ainda não estão alfabetizadas. “A questão mais urgente é garantir que toda criança, de fato, aprenda o que tem direito a aprender, e não apenas frequente a escola”, resume Cláudia.

Para ressaltar os desafios que ainda precisarão ser enfrentados pelos próximos governantes, a pedagoga Anna Helena Altenfelder, presidente do Conselho de Administração do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), cita o baixo índice de sucesso no Plano Nacional de Educação (PNE). Das 20 metas definidas em 2014, apenas uma foi completamente concluída: a que estabelece que pelo menos 75% dos professores da educação superior sejam mestres e 35%, doutores. 

Indicações políticas são nocivas

Influência política em espaços indevidos não é um problema exclusivo de ministérios e secretarias do governo federal, embora lá sejam mais comumente noticiados. Esse tipo de situação acontece, com tanta ou mais frequência, nas pequenas cidades brasileiras. Estudo divulgado pelo grupo Todos pela Educação, com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que 74% dos municípios do país alocam diretores apenas por indicação política, sem a exigência de nenhum nível técnico que os torne aptos a exercer a função. Eles ocupam, muitas vezes sem capacitação, um lugar-chave para a melhoria da qualidade das escolas públicas.

Não por acaso, apenas um em cada três professores dizem que o diretor sempre ou quase sempre dá atenção especial a aspectos relacionados à aprendizagem dos alunos, segundo a Prova Brasil 2015 (questionário do Ministério da Educação usado para avaliar as políticas educacionais). Para Olavo Nogueira Filho, diretor de políticas educacionais do Todos pela Educação, “o governo federal pode, a partir de diretrizes, incidir nesses tipos de política”. Uma medida simples, segundo ele, seria estabelecer pré-requisitos básicos para que os diretores possam assumir a função, o que precisaria ser monitorado pelos governadores e prefeitos. Além de não implicar mais gastos para o governo, essa mudança seria eficiente para, ao menos, diminuir a influência política nas escolas, defende.

O ideal é que o gestor passe por um curso de capacitação, sugere a pedagoga Anna Helena Altenfelder, presidente do Conselho de Administração do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec). “São necessários conhecimentos específicos. Nem sempre o bom professor é o melhor gestor”, explica. Dos professores que atuam diretamente nos municípios, apenas 7% discordam que deveriam existir pré-requisitos técnicos para alguém se tornar diretor de escola, segundo pesquisa nacional feita pelo Ibope, pelo Todos pela Educação e pela Fundação Itaú Social.

O que dizem os presidenciáveis

Geraldo Alckmin (PSDB)

“Transformar a educação é mais do que uma política de governo, é uma política de Estado. Nossa proposta para a educação tem dois objetivos: reduzir a desigualdade e aumentar a produtividade no Brasil. Precisamos priorizar políticas públicas voltadas para a educação. Nosso plano é atacar os principais gargalos da educação em diferentes etapas do ciclo de vida da primeira infância, infância e juventude até a fase adulta, momento em que o estudante deve se conectar com o mercado de trabalho. E melhorar radicalmente a formação e a carreira do professor”

Luiz Inácio Lula da Silva (PT)

“A educação é uma das prioridades do programa de governo, em especial o ensino médio. O plano prevê uma reforma do ensino médio, ampliando a participação da União na oferta dessa modalidade. Entre as diretrizes, estão: ampliação da oferta de formação para educadores e da educação integral; a concretização das metas do PNE; a institucionalização do Sistema Nacional de Educação, e criação de política de apoio à melhoria da qualidade da gestão em todos os níveis; além de novos padrões de financiamento, visando progressivamente investir 10% do Produto Interno Bruto (PIB) em educação.”

Guilherme Boulos (PSol)

“Nossa primeira medida de governo será convocar um plebiscito para reverter o congelamento por 20 anos de gastos públicos. O passo seguinte é ampliar o investimento no setor da educação. Vamos criar o Sistema Nacional de Educação, com a função de coordenar o esforço estatal no direcionamento de recursos públicos, em conjunto com os governos estaduais e municipais, escolas públicas e sociedade civil. O foco será também na valorização dos professores, com melhor formação e salários. Temos também o compromisso de erradicar o analfabetismo, incluindo o funcional. Vamos retomar o crescimento do ensino superior, com investimento nas universidades públicas e nos institutos federais. Nossa meta é criar um milhão de vagas nas universidades públicas com o dinheiro do imposto sobre lucros e dividendos.”

João Amoedo (Novo)

“Nossa meta é estar entre os melhores do mundo nos rankings internacionais da educação básica. Para isso, vamos exigir nomeações técnicas para a direção das escolas assim como capacitar melhor nossos professores. Vamos investir e priorizar a carreira docente. Hoje, o professor passa mais tempo de sua formação em disciplinas teóricas do que práticas. Precisamos inverter essa lógica. Além disso, queremos premiar o bom desempenho das escolas na distribuição dos recursos. Queremos utilizar parte da verba federal da educação para premiar os estados e municípios com melhor desempenho.”

Ciro Gomes (PDT)

“No ensino básico, vamos implementar paulatinamente creches de tempo integral. Vamos investir fortemente na melhoria no ensino fundamental, e almejamos obter os mesmos resultados alcançados no Ceará, que tornou-se referência nacional. Outra meta é introduzir a educação de tempo integral no ensino médio. A política educacional vai reconhecer e valorizar o professor, o diretor e o gestor do ensino. As universidades públicas deverão, além de ampliar a oferta de vagas e prosseguir com as políticas de cotas, estreitar os laços com as políticas e ações no campo da ciência, tecnologia e inovação. Como objetivo, vamos caminhar na direção do alcance das metas de desenvolvimento sustentável da ONU e persistir na aplicação das metas estabelecidas no PNE. Vamos eliminar o subfinanciamento das despesas causado pela Emenda do Teto de Gastos.”

Henrique Meirelles (MDB)

“É fundamental uma descentralização de recursos e de responsabilidades. Minha avaliação é que a forma de viabilizar o acesso de crianças de famílias pobres às escolas privadas é através de vouchers e de renúncias fiscais controladas capazes de criar os incentivos necessários para que as escolas privadas aceitem esses alunos. Na educação infantil, meu objetivo é estender o Prouni para creches e para o ensino fundamental. Ou seja, conceder renúncia fiscal para as creches e pré-escolas privadas que se dispuserem a conceder bolsas de estudo para crianças de famílias pobres, que estejam no cadastro do Bolsa Família.”

Marina Silva (Rede)

“A educação precisa ser reinventada com ensino dinâmico, que atraia os estudantes com metodologias inovadoras e novas tecnologias. A educação precisa conversar com a vida real. Uma educação desde a base, com atenção especial à primeira infância. Uma educação boa para quem educa, com valorização dos professores e funcionários. Eu aprendi a ler aos 16 anos e me tornei professora e psicopedagoga. A defesa da educação que garante igualdade de oportunidades é um compromisso.”

Os pré-candidatos Jair Bolsonaro (PSL), Manuela D’Ávila (PCdoB) e Álvaro Dias (Podemos) foram procurados, mas não responderam aos questionamentos da reportagem até o fechamento da edição.

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