ONDA SUFRAGISTA

Martha de Hollanda: um baluarte do feminismo em Pernambuco

No dia 15 de março de 1933, há exatos 90 anos, Martha entrava para a história ao tornar-se a primeira eleitora pernambucana

Publicado em: 15/03/2023 07:30 | Atualizado em: 15/03/2023 12:25

Martha era ousada, fumava, bebia e não se curvava aos princípios cristãos (Foto: Reprodução )
Martha era ousada, fumava, bebia e não se curvava aos princípios cristãos (Foto: Reprodução )
Pernambuco é, historicamente, marcado por vieses sufragistas. Um dos grandes baluartes da luta por igualdade de gênero, além do feminismo, tem nome e sobrenomes: Martha de Hollanda Cavalcanti. Ativista nascida em Vitória de Santo Antão, na Zona da Mata, entrou para a história ao tornar-se a primeira eleitora pernambucana, feito que completa exatos 90 anos e, até hoje, outras mulheres colhem seus frutos.

À frente de seu tempo, Martha tinha um jeito ousado. De vestido curto, sem mangas, porém cheio de enfeites, subiu ao altar para unir-se ao poeta José Teixeira de Albuquerque. Em uma espécie de provocação, antes do casamento, cortejou pelas ruas da cidade em um carro sem capota, mostrando seu traje a todos vitorienses. Na igreja, entrou segurando um buquê iluminado por uma pilha escondida sob o arranjo. Uma criança quase despida,representando um cupido com uma tiara de flores, além de asinhas, arco e flecha, levava as alianças ao altar, à medida em que escandalizava os convidados.

Mas nada foi tão marcante quanto a luta pelos direitos das mulheres. Conseguiu, através de medida judicial, o direito ao voto, em 1933. Dois anos antes, havia fundado a Cruzada Feminista Brasileira, com forte atuação nos anos seguintes e, estrategicamente, utilizando os veículos de comunicação para divulgar seu pensamento. Dedicou-se à poesia, ao jornalismo e - especialmente - ao feminismo. Publicou apenas um livro de poemas – “O delírio do nada”, de 1930. 

Os feitos de Martha inspiraram outra escritora pernambucana, Luciene Freitas, mestra em língua portuguesa. “Uma guerreira no tempo: Resgate de uma época, Martha de Hollanda e o delírio do nada” foi lançado em 2003, no centenário de nascença da personagem. 
 
“Estive na casa da irmã dela e acabei tendo a ideia de escrever o livro. Lá eu vi uma foto de Martha na parede e perguntei quem era. Achei estranho porque a família nunca queria falar sobre Martha. Aí eu fui à biblioteca pública e encontrei muita coisa. A pesquisa durou sete anos e eu fui descobrindo o que se passou naquela época. Em Vitória, alguns ainda guardam um ‘ranço’ dela. Por naquele tempo a mulher não poder fazer determinadas coisas, ela saiu de Vitória com muito desgosto. Deixou até escrito para a família que não levassem os ossos dela porque ela não queria ser enterrada lá”, falou Luciene ao Diario.

Voz a outras mulheres 

O pioneirismo de Martha não se limitou ao século passado e desbravou-se nos dias atuais. Também no âmbito político, outras conterrâneas entraram para a história em 2023: Luciana Santos (PCdoB) e Teresa Leitão (PT), a primeira pernambucana ministra e a primeira pernambucana a se eleger senadora, respectivamente. Além delas, Raquel Lyra (PSDB) se tornou a primeira governadora do estado. 

"Devemos sempre honrar a luta das mulheres que vieram antes de nós. Sem elas, não estaríamos aqui. Assim é com Martha de Hollanda, uma mulher à frente de seu tempo. Escritora, ativista, corajosa e pioneira: a primeira pernambucana a votar. O direito ao voto é um marco para um novo tempo de inserção das mulheres na esfera pública. E não veio de uma concessão de homens, é uma conquista das mulheres, da qual derivaram outros avanços. Mulheres como Martha não só pavimentaram o caminho para que hoje estejamos ocupando espaços de poder e decisão, como nos inspiram a seguir na trincheira da equidade", destacou Luciana. 

Teresa, por sua vez, também enalteceu a história de Martha, tal qual seus feitos no geral. "Foi uma mulher de personalidade muito forte no feminismo, sempre à frente do seu tempo. Além disso, era ativista cultural, disseminando seus discursos sufragistas no rádio, mobilizando esse setor. Foi aquele tipo de mulher necessária, plantou uma semente que nós hoje colhemos. Naquele tempo as mulheres não podiam nem votar. E hoje nós podemos nos candidatar. Agradeço a ela por ter sido uma precursora, que me possibilitou se tornar a primeira senadora mulher por Pernambuco", frisou Leitão.
 
“A luta pela participação das mulheres na política do nosso país é antiga e está longe do fim. Diversas questões de ordem social e econômica acabam afastando as mulheres dos espaços de poder, mas são figuras como Martha de Hollanda que nos inspiram a jamais desistir dessa batalha. Uma mulher à frente do seu tempo, corajosa, e que abriu portas para que tenhamos o destaque e a força que adquirimos ao longo desses anos”, disse Raquel.  

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