Justiça

Caso Rodrigo Carvalheira: empresário é alvo de protesto em fórum no dia de audiência

Familiares e amigos de vítimas de crimes sexuais foram ao fórum, nesta segunda (15), na área central do Recife

Publicado em: 15/07/2024 09:48 | Atualizado em: 15/07/2024 12:48

Mulheres protestaram na audiência Rodrigo Carvalheira  (Foto: Marina Torres/DP)
Mulheres protestaram na audiência Rodrigo Carvalheira (Foto: Marina Torres/DP)
 
 
Familiares e amigos de vítimas e representantes de entidades que denunciam violência contra as mulheres  realizam, nesta segunda (15), um ato contra o empresário Rodrigo Carvalheira, de 34 anos, réu por crimes sexuais.

Carvalheira participa de uma audiência de instrução e julgamento no fórum desembargador Rodolfo Aureliano, na Joana Bezerra, na área central do Recife, onde acontece a manifestação. 

Presente no ato, a mãe de uma das vítimas, que por segurança não será identificada, afirma que o propósito do protesto é clamar por justiça. “Milhares de mulheres são estupradas das mais variadas formas, todos os dias em nosso país e a impunidade continua presente. A gente precisa colocar o estuprador onde deve ser, na cadeia”. 

A filha dela é uma das meninas que irá depor como testemunha nesta segunda. O caso dela foi prescrito, ou seja, o Estado não tem mais como executar a punição contra o empresário. “Minha filha foi estuprada com 16 anos, hoje ela tem 34 anos, ela ficou muito traumatizada, quando ela fala do assunto, ela sangra”, conta. “Mesmo com todo o apoio, o trabalho emocional, ela ainda tá bem ferida. O que fica no corpo e na emoção é a dor”.

Trajados com camisas escrito “Amigo Não Abusa”, em alusão a um dos argumentos apresentados pelo suspeito, que era amigo das vítimas, dois parentes de uma outra vítima do empresário, que por segurança também não serão identificados, também participaram do ato.

Para eles, a mudança foi psicológica foi perceptível. “Ela foi abusada em 2019, na época a gente não sabia, mas percebemos que ela estava diferente. Não saia tanto, ficava mais em casa. Estava cada vez mais introspectiva”, relata um dos parentes. “Até que em novembro do ano passado, ela fez uma ligação de vídeo com a gente e foi quando ela desabou e contou tudo que aconteceu. Foi só aí que a família ficou ciente”, explica outro. 

A vítima prestará depoimento nesta segunda. “Estamos ajudando como podemos. O que a gente pode fazer, estamos fazendo, que é, ficar do lado dela, apoiar todas as decisões, incentivar outras mulheres a estarem nessa luta”, afirma. 

“Como que um cara fala que é amigo e faz isso? Seis denunciaram, fora as várias que se sentiram violadas e ele fala que tá certo? Que é amigo? Amigo cuida, poxa”, indaga um dos parentes. 

Entidades feministas 

“Segundo eles, as vítimas desse estupro são ‘meninas de festinha’”, pontua Lara Buitron, do grupo Fórum de Mulheres de Pernambuco. “São meninas que estão aí para serem usadas, esse é o sentido que o advogado coloca nas suas frases. Para culpabilizar as vítimas eles estão colocando que elas são usuárias de drogas, o que não tem nenhum problema, usar drogas não significa que seu corpo está disponível para ser violentado. É exatamente o mesmo argumento usado no caso de  ngela Diniz, morta em 1986”, relembra. 

Advogada e líder do comitê de combate a violência contra mulheres do Grupo Mulheres do Brasil Recife, Barthira Caldas, comenta que a luta das mulheres é provar que têm direitos e deveres, diariamente. “Então assim, é muito importante que a gente traga essa pauta, que a gente apoie outras mulheres, que as mulheres estejam juntas nesses movimentos. Temos que exterminar a violência contra a mulher, porque a violência não é só a física. Quer dizer que mulheres não podem de forma nenhuma sair, se divertir, não têm o direito, como todos os homens fazem, a gente não pode ter esse direito. Estamos regredindo?”, questiona. 

Barthira ainda pontua que a agressão contra a mulher não é uma agressão apenas à vítima. “Quando se fala em agressão contra a mulher, se destrói uma família. E, também, uma nova geração de meninas e adolescentes que estão passando e vivenciando já desde nova essas violências. Nossa luta é essa. Exterminar a violência contra a mulher”. 

O caso 

Desde junho Rodrigo Carvalheira está detido. Essa é sua segunda captura este ano. A primeira aconteceu em abril, quando o suspeito ficou menos de uma semana no Cotel, em Abreu e Lima, no Grande Recife. 

Na audiência desta segunda-feira (15), Rodrigo chegou ao Fórum acompanhado de policiais penais. Ao ser questionado pela imprensa se tinha algo a declarar sobre o caso, ele disse: “Os humilhados serão exaltados”. 
 
Rodrigo Carvalheira chegou para audiência por volta das 9h40 (Foto: Marina Torres/DP)
Rodrigo Carvalheira chegou para audiência por volta das 9h40 (Foto: Marina Torres/DP)
 
 
A segunda prisão foi pedida pelo Ministério Público (MPPE) devido a uma ligação que Rodrigo Carvalheira teria feito em dezembro de 2023. Ele teria mantido contato com o tio de uma suposta vítima. 

Assim, o MPPE considerou que o empresário estaria interferindo nas investigações do caso.

Por meio de nota, a Polícia Civil disse que: "A Polícia Civil de Pernambuco informa que, por meio de equipe da 1ª Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher de Santo Amaro, deu cumprimento a Mandado de Prisão expedido pela 18ª Vara Criminal da Capital em desfavor de um homem, de 34 anos. A prisão foi efetuada, na manhã desta quinta-feira (06), no bairro de Boa Viagem, Recife. O acusado segue no momento para o Instituto de Medicina Legal (IML) e, em seguida, será recolhido ao Cotel". 

Inquéritos

No dia 31 de maio, a Polícia Civil pernambucana detalhou o estágio dos cinco inquéritos que investigaram o empresário, de 34 anos, por envolvimento em  crimes sexuais contra mulheres. 

Em três casos, ele foi indiciado por estupro de vulnerável. 

Os outros dois prescreveram. Ou seja, o Estado não tem mais como executar a punição contra o empresário.

Em todos, no entanto, a Polícia Civil encontrou um ponto em comum: Carvalheira aproveitou relações de amizade para poder estuprar as vítimas. 

Além disso, em todos os episódios, segundo a polícia, as vítimas estavam sob efeito de álcool ou em estado de sonolência. 

A corporação também afirmou que duas das cinco mulheres abusadas pelo empresário eram adolescentes na época em que os estupros aconteceram.

Uma delas sofreu a violência sexual no dia do próprio aniversário de 16 anos, em 2009. 

A outra também tinha 16 anos na época em que foi estuprada, em 2005. 

Esses dois são justamente os casos que  prescreveram.

Dessas duas vítimas, uma delas foi estuprada quando estava em estado de embriaguez e outra quando estava sob o efeito parcial de embriaguez, segundo a polícia.  

As delegadas responsáveis pelos cinco inquéritos, Larissa Azedo e Jéssica Ramos, detalharam como o empresário agia. 

“A conduta do investigado revelou o mesmo método de ação. Foram feitas várias diligências, algumas sigilosas. A gente constatou que  existiam elementos suficientes para fazer o indiciamento. A gente identificava o estado de vulnerabilidade das vítimas e o elo de confiança que o investigado tinha com elas. O que torna elas mais vulneráveis ainda, pela relação de confiança e retirada de vigilância. Eram relação de amizade prévia. Outras mulheres  que também eram consideradas amigas do investigado perceberam que passaram pela mesma coisa. Essas vítimas levavam um bom tempo para perceber que tinham sido vítimas de um crime”, disse a delegada Jéssica Ramos, titular da 1ª Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM). 

A investigadora ainda disse que: “Esses fatos são bem diferentes dos casos de estupro que estamos acostumados a ver. Aqui, a gente trata de uma relação de grupo de amigos, em que a vítima não espera ser abordada de alguma maneira indesejada que está ali convivendo com você. Aquele pessoal que faz parte do grupo de amigos se surpreende com atitudes de violência sexual. Ficaram evidenciadas tentativas de relações sexuais,  quando as vítimas estavam em  estado de sonolência ou embriagadas, pelo uso de álcool. Então, esse estado em que a pessoa se encontra em sonolência ou embriaguez acaba a tornando vulnerável. Ela não consegue optar, de fato, e saber o que  quer ou não quer deixar acontecer. Algumas vítimas nem se lembram como deixam acontecer as situações. Então, o ponto-chave é que havia sempre essa relação de amizade e confiança. Algumas vítimas tiveram somente a coragem de denunciar anos depois, o que não significa que o crime não deixou de acontecer”. 

O que disse a defesa de Rodrigo Carvalheira 

Procurada pela reportagem do Diario de Pernambuco, a defesa de Rodrigo Carvalheira, feita pelos advogados Wilibrando Albuquerque, Thiago Guimarães e  Dyego Lima, disse, na época da prisão,  que: “ Repudiamos veementemente as acusações infundadas e esperamos que a verdade prevaleça, assegurando a integridade e os direitos fundamentais do Sr. RODRIGO. Nosso cliente segue confiando no Poder Judiciário e continua à disposição, colaborando com Justiça”.