Intolerância

Homem destrói terreiro de candomblé no bairro da Várzea, no Recife, e é denunciado por vereadora

As vítimas registraram um Boletim de Ocorrência na Central de Plantões da Capital (Ceplanc)

Publicado em: 03/07/2024 17:52 | Atualizado em: 03/07/2024 18:09

Nas imagens registradas, é possível ver um homem, identificado no vídeo apenas como Tiago, quebrando vasos com plantas e um banquinho feito com madeira e pneus (Foto: Reprodução/Twitter)
Nas imagens registradas, é possível ver um homem, identificado no vídeo apenas como Tiago, quebrando vasos com plantas e um banquinho feito com madeira e pneus (Foto: Reprodução/Twitter)
Um caso de intolerância religiosa foi denunciado pela vereadora do Recife Cida Pedrosa (PCdoB) através das redes sociais nesta quarta-feira (3). O vídeo divulgado mostra um homem destruindo objetos de decoração de um terreiro de cancomblé localizado no bairro da Várzea, na Zona Oeste da capital.

Nas imagens registradas, é possível ver um homem, identificado no vídeo apenas como Tiago, quebrando vasos com plantas e um banquinho feito com madeira e pneus. Um candomblecista que estava filmando a depredação questiona se as coisas serão resolvidas desta maneira. Ao fundo, outra pessoa sugere que a polícia seja acionada.

Em entrevista ao Diario de Pernambuco, Jefferson Fernandes, que é filho de Santo da Mãe Laiane, as ameaças começaram há seis meses quando o vizinho comentou com a vítima que não concordava com a criação de uma biblioteca e praça comunitárias que seriam criadas pelos donos do terreiro.

“Ontem já aconteceu um evento, que marca o começo das agressões. Ele [o vizinho] pega pneus e joga fora. A gente tem pneus como vasos ecológicos e a gente tem um vídeo que constata ele pegando um pneu durante uma discussão. Tem um momento que ele joga um pneu que quase bate no rosto de um irmão de santo. Hoje, literalmente, ele quebra tudo, como está constatado no vídeo que foi gravado por outro irmão de santo”, relata Jefferson.

Após o caso ocorrido nesta quarta-feira, as vítimas foram para a delegacia registrar um Boletim de Ocorrência. “Hoje está sendo a primeira vez que nós estamos denunciando. Infelizmente, nos foi negado o pedido de denúncia por racismo religioso. Foi entendido somente como crime de perdas e danos. Não foi caracterizado, não foi entendido pelo delegado, o crime de racismo”, conta Jefferson.

Segundo ele, a Mãe Laine está “desestabilizada” com a situação, pois foram dois dias de “agressão” e a comunidade também ficou mobilizada com o caso.

Por meio de nota, a Polícia Civil de Pernambuco informou que registrou nesta quarta-feira,  “por meio da Central de Plantões da Capital, ocorrência de dano/depredação e injúria em desfavor de um homem de 43 anos”.

Ainda de acordo com a PC, as investigações foram iniciadas e seguem em andamento até a completa elucidação do caso.

De acordo com a equipe de Cida Pedrosa, a vereadora tem acompanhado o caso desde que eram apenas ameaças. “Hoje de manhã, quando ocorreu o fato, ela se posicionou rapidamente através das redes sociais" e cobrou respostas das autoridades sobre o caso, segundo a nota enviada ao Diario.
 
Intolerância religiosa
 
De acordo com o artigo 208 do Código Penal Brasileiro, é crime “escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso”. 

A pena para estes atos é de detenção de um mês a um ano ou multa. E se houver emprego de violência, a pena é aumentada. 

Em 2023, a Lei nº 14.532/2023 acrescentou ao artigo 140 do Código Penal o parágrafo terceiro. este determina que, no caso do crime de injúria, se ela consistir na utilização de elementos referentes a religião ou à condição de pessoa idosa ou com deficiência, a pena para o crime será de reclusão de um a três anos e multa.
 
Segundo a advogada e cientista social, Paula Rúbia Torres, a vítima deve reunir o máximo de provas possíveis ao perceber que está sendo vítima de intolerância religiosa. "Fatos, fotos, vídeos, testemunhas, tudo que ela tiver a respeito, como conversas, prints e tudo que tiver caráter probatório é válido", orienta. 
 
"A vítima pode, além da delegacia, procurar o Ministério Público caso as denúncias não sejam devidamente tratadas (inclusive, o Ministério Público de Pernambuco possui um grupo de trabalho específico com a temática de racismo, com competência para tratar casos como estes)", explica a advogada.
 
Ainda de acordo com a especialista, "em muitos dos casos, há uma dificuldade de classificar penalmente o crime como sendo de intolerância, pela falta de previsão de conduta específica na lei. Por exemplo, um bem que é do terreiro ou da igreja, mas não faz parte de um acervo de celebrações, um bem comum danificado: vai ser classificado apenas como crime de dano. Muitos dos casos de racismo religioso acabam caindo na multidão de crimes afeitos a questões de vizinhança".
MAIS NOTÍCIAS DO CANAL