Música
Tocador de pífano desafiado por Lampião lança primeiro disco solo aos 96 anos
Sebastião Biano é o único remanescente da formação original da Banda de Pífanos de Caruaru
Por: Larissa Lins - Diario de Pernambuco
Publicado em: 28/07/2015 07:45 Atualizado em: 28/07/2015 17:43
Biano começou a tocar pífano aos cinco anos. Foto: Alexandre Nunis/Divulgacao |
Sebastião Biano é o último remanescente da formação original da Banda de Pífanos de Caruaru, um dos grupos intrumentais familiares mais antigos do país, formado em 1924. A primeira vez que ouviu falar sobre um pífano, lhe disseram que se tratava de um "pedacinho de madeira" com sete furos, sendo um para sopro e seis para os dedos. Pareceu divertido. Ele tinha cinco anos e já acompanhava o pai nos afazeres da roça, quando aproveitava para enrolar folhas de jerimum e usá-las como apito. O irmão, Benedito, fazia o mesmo, enquanto o pai, Manoel Clarindo, observava a brincadeira sem repreender.
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Neste mês, o menino que assobiava nas folhas de jerimum lança Sebastião Biano e seu terno esquenta muié, a estreia solo. O primeiro show ocorre em São Paulo, no dia 30. Antes, foram sete álbuns com a Banda de Pífanos de Caruaru, produzidos entre 1972 e 2003. O grupo - ainda em atuação - ostenta no currículo a gravação de Pipoca moderna por Gilberto Gil, em Expresso 2222 (1972), além de um Grammy Latino (Melhor Álbum de Música Regional ou de Raízes Brasileiras, em 2004).
Aos oito anos, Biano foi desafiado por Lampião. E ganhou elogios. Foto: Rafael Pimenta/Divulgação |
A confiança no próprio talento escapou de Sebastião somente uma vez na vida: aos oito anos, ao ser desafiado por Lampião. Acompanhado do pai e do irmão, estava há nove dias hospedado na casa de um rico fazendeiro, animando as festas de graças pela boa colheita da temporada. No último dia, enquanto o vigário rezava missa na capela da fazenda, o bando de cangaceiros invadiu a propriedade. Biano segurou a mão do irmão, a fim de fugirem juntos. “Ninguém corre”, advertiu o pai dos meninos.
Lampião se aproximou e, após anunciar que a visita se devia a um acerto de contas com o padre (queria quitar dívida com Nossa Senhora da Saúde, da cidade de Tacaratu), ordenou que os meninos tocassem o pífano. “Se sabem, toquem.” Os dois molharam (literalmente) as calças. "Minha língua estava grudada na boca, eu mal conseguia soprar", recorda Biano. Quando o pife finalmente soou, Lampião mandou buscar dois cangaceiros do bando - os responsáveis pela música durante as viagens - e bradou: "Esses dois pivetes tocam melhor que vocês, seus dois cavalões velhos!".
- A TERRA PROMETIDA
Biano considera o episódio prova da aptidão da Banda de Pífanos. Cita o testemunho com família de todo tipo de miséria, entre 1926 e 1939, enquanto migrava a pé, de Mata Grande (AL) a Caruaru (PE). Na estrada, não havia comida, higiene ou abrigo. Mas só o som do pífano. "A cena de que nunca me esqueço é a da nossa chegada a Pernambuco. O verde, a fartura, as terras caruaruenses. Ali acabou-se a nossa fome de tudo!". “Daquele dia em diante, conheceram nossa música. E ela, que é meu legado, nunca mais se calou.”
O disco é o primeiro solo de Sebastião Biano, aos 96 anos. Foto: Sesc/Divulgação |
O DISCO
Sebastião Biano e seu terno esquenta muié tem participação de Naná Vasconcelos em três das 18 faixas. Eder Rocha (Mestre Ambrósio), Renata Amaral (A Barca), Filpo Ribeiro (Pé de Mulambo) e Júnior Caboclo complementam a formação do grupo Terno Esquenta Muié, projeto da carreira solo de Sebastião Biano. Biano ainda se apresenta com a Banda de Pífanos de Caruaru, cuja formação atual inclui Junior Kaboclo (pífano), João Biano (zabumba), Amaro Biano (surdo), Gilberto Biano (caixa), José Biano (pratos) e Jadelson Biano (percussão).
SERVIÇO
Sebastião Biano e seu terno esquenta muié
R$ 20 (no Sesc e pelo site sescsp.org.br/livraria)
Assista ao making of do disco:
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