Foi confirmada nesta quarta a morte do artista plástico pernambucano Rodolfo Mesquita. Conhecido principalmente por causa de desenhos de forte teor crítico sobre o comportamento humano, ele é um dos artistas mais cultuados e influentes no meio artístico do estado, apesar de ser bastante recluso.
Mesquita começou a carreira na década de 1970 e teve a obra revalorizada nos últimos 15 anos graças a exposições na Galeria Amparo 60 e no Museu Murillo La Greca, ambos no Recife. Ele também inspirou um curta-metragem dirigido pelo cineasta Pedro Severien, lançado em 2013.
As causas da morte ainda não foram identificadas. Ele morava sozinho e foi encontrado em casa. O enterro está previsto para sexta-feira.
Rodolfo Mesquita deixa um filho (o ator, diretor, coreógrafo e dançarino João Lima) e um neto, que moram em Barcelona.
Assista ao curta de Pedro Severien sobre o artista
Rodolfo Mesquita e as monstruosas máscaras de alegria e felicidade (2013/Brasil/HD/14'05") from Pedro Severien on Vimeo.
Leia texto sobre a obra de Rodolfo Mesquita publicado no Viver em 2003, escrito por Júlio Cavani:
A contemporaneidade pulsa forte na obra de Rodolfo Mesquita. Se uma das principais marcas do presente momento histórico é a profusão simultânea de informações de diversas origens e a interdependência entre o local e o mundial, a obra do artista reprocessa esse contexto em um resultado poético situado ao mesmo tempo entre o satírico e o cruel. O artista volta à evidência com a exposição Desenhos Urgentes, na galeria Amparo 60, na qual faz ressurgir para o público um estilo que mantém-se intacto há décadas, mas que nunca adormeceu e parece estar cada vez mais sintonizado com a condição atual da sociedade.
No ateliê de Rodolfo Mesquita, recortes de jornal e um rádio transmitindo notícias são tão importantes quanto pincéis, canetas, telas, papéis e tintas. Não que os fatos do mundo se tornem temas principais de suas obras, mas são uma das maiores fontes de inspiração do artista, que as absorve, mastiga e joga nos quadros, fazendo o mesmo com referências literáriase visuais, histórias do cotidiano e informações veiculadas pelos meios de comunicação em geral. %u201CPego material que vejo na mídia e tento retratar nos quadros. São referências do que acontece no mundo. Às vezes dá certo, às vezes não%u201D, conta o artista, que se aproveita do resultado nesses dois casos. É como se ele fizesse um jornalismo às avessas, já que parte da notícia para subvertê-la em seguida, inclusive desvinculando-se do factual.
Rodolfo tem uma intencionalmente incômoda forma de retratar o ser humano, principal tema das obras. Seus homens trazem sempre alguma deformação, ou posição contorcida, que lhes confere uma ar patético e muitas vezes hediondo. Essa é a visão que ele quer transmitir sobre o indivíduo e a sociedade. Em um dos quadros, um militar, aparentemente de alta patente, esconde atrás das costas sua mão grande e deformada, uma possível representação de sua inconseqüência ou vergonha. Em outro desenho, um soldado ganha feições de suíno, num comentário crítico sobre a guerra.
Rodolfo desmente que sua obra seja pessimista, até porque abre muito espaço para o humor e a alegria, mesmo que sempre com algum tom irônico. Sua interpretação sobre a vida seria simplesmente cética, fiel ao que se vê nas ruas. Sua obra também não está sempre ligada a acontecimentos ou eventos, tendo espaço também para imagens mais intimistas, reflexivas, fictícias e alegóricas. O tom filosófico de algumas obras é reforçado por citações literárias (nem sempre fiéis às várias fontes), transcritas ao lado dos desenhos.
Temáticas sociais, mesmo que não sejam preocupação primordial do artista (pois sua arte não precisa possuir função), ganham evidência em sua produção. Enquanto a arte brasileira se volta para esse aspecto em febres momentâneas, Rodolfo nunca deixou o tema de lado, pois suas fontes de inspiração não permitem.
Pedro Severien, cineasta:
Rodolfo é um dos artistas mais plenos que conheci. Ele criou um universo próprio. Sua disciplina e suas ideias sobre arte e vida me influenciaram muito. As conversas que tive com ele são preciosidades que guardarei com muito carinho.
Cavani Rosas, desenhista:
Estou muito triste, éramos muito amigos. Acho que ele é muito importante para o estado. Não era muito conhecido pelo grande público, mas a obra dele inspirou muita gente.
Paulo Bruscky, artista multimídia:
Rodolfo foi um cara que não caía na mesmice, um grande artista. Ele estava entre os que contribuíram com os jornais nos tempos de ditadura militar. As ilustrações dele saíam nas publicações com muita ironia. O senso de humor dele é genial. Com certeza, vai fazer muita falta.
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