TEATRO

As facetas de uma nação

Espetáculo musical baseado no romance 'Viva o povo brasileiro' - clássico de João Ubaldo Ribeiro que está completando 40 anos - volta ao Teatro do Parque para três apresentações

Publicado em: 05/07/2024 06:00 | Atualizado em: 05/07/2024 09:08

 (Foto: Marcelo Rodolfo)
Foto: Marcelo Rodolfo
Retorna hoje ao Recife a adaptação musical de um clássico da literatura brasileira que, através de 27 composições originais, aumenta ainda mais a força das palavras. Viva o povo brasileiro (de Naê a Dafé), livro de João Ubaldo Ribeiro (1941-2014), está completando 40 anos de lançamento e boa parte do seu impacto pode ser testemunhado através do trabalho dirigido por André Paes Leme, um projeto que retorna ao palco do Teatro do Parque para três apresentações: hoje, amanhã e domingo, sempre às 19 horas. O espetáculo veio pela primeira vez à capital pernambucana para duas sessões no Festival Recife do Teatro Nacional de 2023 e retorna simbolicamente no mês em que está fazendo também 10 anos do falecimento do autor baiano.

Contando com patrocínio do Nubank, que viabilizará ampla circulação da peça por cidades do Nordeste e novas temporadas no Rio de Janeiro e São Paulo, a adaptação ganhou novos contornos e dimensões com o passar do tempo e dos acontecimentos que marcaram a sociedade brasileira na última década. A pesquisa de doutorado feita por André Paes Leme, na Universidade de Lisboa, foi o ponto de partida para que o diretor começasse a buscar um projeto que dialogasse com debates históricos – e, tendo produzido para o teatro adaptações como A hora da estrela ou o canto de Macabéa, A hora e vez de Augusto Matraga e Engraçadinha, ele se lançou no que sabia ser um grande desafio artístico e conceitual.

Com cerca de 700 páginas e uma proposta narrativa que percorre quatro séculos da história do Brasil, o romance Viva o povo brasileiro é ambientado em Itaparica e trata de uma alma que deseja ser brasileira, encarnando inicialmente nos indígenas até chegar no personagem Caboclo Capiroba que, no século 17, é enforcado pelos colonizadores portugueses, deixando uma filha chamada Vu, de quem as mulheres da história descendem. A vontade de entender a essência brasileira a partir da visão crítica, questionadora e bem-humorada de João Ubaldo Ribeiro foi central para que André decidisse que seria o momento de desenvolver a adaptação, que pega praticamente um terço do livro e intenta ser apenas o começo de uma série de, a princípio, seis espetáculos – cada um com cerca de 3 horas de duração.

"Não há possibilidade de entender o povo brasileiro sem compreender que todos nós somos esse povo brasileiro, desde os originários até os imigrantes. Esse espetáculo traz a essência da obra na questão da ancestralidade, espiritualidade, da luta contra a escravidão, da luta por uma igualdade e justiça social. O texto é muito conectado à força feminina, sobretudo a partir da personagem da Maria Dafé, a grande heroína da história", comentou o diretor em entrevista ao Viver. "A alta de discussão das pautas de reparação histórica e toda a turbulência de acontecimentos políticos pelos quais o Brasil vem passando nos últimos anos só deixou a obra ainda mais complexa. Quando comecei não tinha ideia da dimensão que a adaptação tomaria, mas a cada ano que passa me parece que ela ganha força, sendo mais atual hoje até do que 40 anos atrás", pontuou André.

A ideia de costurar musicalmente os temas, de acordo com o diretor, acaba reforçando a relação emotiva da plateia com o espetáculo, que conta com direção musical e trilha sonora de João Milet Meirelles, da banda BaianaSystem, e ainda traz no elenco Alexandre Dantas, Guilherme Borges, Izak Dahora, Jackson Costa, Júlia Tizumba, Luciane Dom, Lucas dos Prazeres, Maurício Tizumba e Sara Hana. "Eu organizo toda a linha dramatúrgica e, a partir dela, tento identificar onde a música vai me trazer uma potência maior de comunicação. A música tem um componente do sensível, um aspecto emocional que tem um potencial enorme de envolver a plateia, ao contrário do texto da literatura que, a depender do caso, pode ser mais frio, seco e analítico. A canção cria outros ambientes cênicos e outras formas de beleza, além do fato de Chico Cesar ser um poeta extraordinário, que pega o trecho exato do livro que eu quero trabalhar e relê aquilo se apropriando musicalmente de maneira inacreditável. Estou muito feliz de ver esse projeto voltando ao Recife", completou.
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