XILOGRAVURISTA

Relembre a última entrevista de J. Borges ao Diario de Pernambuco

Artista recebeu o Diario de Pernambuco em seu ateliê, localizado em Bezerros, em 2023

Publicado em: 26/07/2024 12:24 | Atualizado em: 26/07/2024 16:02

 (Reprodução de vídeo)
Reprodução de vídeo

'Até hoje, não me considero artista.' Com essa modéstia e simplicidade, José Francisco Borges concedeu sua última entrevista ao Diario de Pernambuco em setembro de 2023, no seu ateliê localizado em Bezerros, no Agreste de Pernambuco. O Mestre da Xilogravura, como J. Borges é mundialmente reconhecido, teve a morte confirmada nesta sexta-feira (26/07), Seu legado, no entanto, está imortalizado por meio de suas obras e dos ensinamentos que deixou, como evidenciado nesta entrevista que está dividida em duas partes no YouTube do Diario.

 

 

No começo, mestre J.Borges responde como enveredou pelo mundo da sonora e ritmada poesia de cordel. "Com 20 anos, comecei a entender sobre comprar e vender cordel nas feiras. Naquela época, eu já trabalhava como carpinteiro e mecânico, e nos fins de semana ia para a feira. Foi então que me deu vontade de escrever um cordel. Escrevi e mostrei para um amigo meu, que já era veterano, e ele elogiou, dizendo que estava muito bom. Decidimos imprimir, e fizemos um milheiro. Em um mês, vendi tudo e, então, reimprimimos e comecei a escrever outro".

 

Ele relembra quando surgiram as primeiras encomendas a pedido de outros cordelistas. "Assim, comecei a escrever e ilustrar para mim mesmo. Quando já tinha cerca de dez cordéis, outros cordelistas da época perguntaram: 'Quem está ilustrando para você?' Eu respondi que era eu mesmo. A partir daí, eles começaram a me encomendar ilustrações. Um pedia um vaqueiro, outro um casal se beijando, outro um pé de árvore, um passarinho... e eu fazia tudo por cinco cruzeiros."

 

 

 

Borges lembrou do episódio em que o amigo, padrinho e tutor artístico Ariano Suassuna conheceu pela primeira vez seu trabalho. "Ele comentou que, se não saísse de casa, nunca descobriria os valores do interior. 'Olha, não estou recebendo ninguém, mas quero conhecer essa pessoa.' Desde aquele dia, quando Ariano me disse que eu era o melhor do Nordeste e do Brasil, minha vida tomou outro rumo e não tive mais descanso, graças a Deus, até hoje."

 

Outro momento marcante na carreira do artista ocorreu quando o Papa Francisco recebeu, como presente do presidente Lula, a gravura 'Jesus, Maria e José: A Sagrada Família', durante uma visita ao Vaticano. "Eu pensei logo que um comercial desse não tem dinheiro que pague, porque o Presidente da República do nosso país levou minha gravura para dar ao Papa e recebeu-a com carinho. Isso engorda muito o currículo do cara, né? Foi isso que eu pensei. E, realmente, o povo abraçou a gravura de uma maneira tão intensa que, até ontem, ainda tinha umas três".

 

De acordo com Borges, embora não se considerasse um artista, ele percebeu que outros o viam assim quando ilustrou a identidade visual do encontro Brasil-Suíça. "Olha, desde que Ariano disse que eu era o melhor, eu criei um grande impulso na arte. Mas eu nunca me considerei um artista. Até hoje, ainda não me vejo dessa forma, sabe? No entanto, o povo me chama de artista desde que ultrapassei fronteiras. Quando ilustrei o encontro Brasil-Suíça e fui responsável por toda a identidade visual — caixás, crachás, cartazes —, fizeram um cartaz de cinco metros com minha gravura. Aí eu pensei: 'Não é o que o povo diz? Parece que agora sou artista.'"

 

Em 2001, J. Borges foi o único artista brasileiro convidado a contribuir com sua arte para o calendário oficial da ONU, que é elaborado a cada dez anos. "Eu fui escolhido para criar a capa. Fiz a arte, o julgamento aconteceu em Zurique, na Suíça, e foi aprovada, resultando na produção do calendário. Esse foi um grande passo na minha carreira, e meu currículo cresceu bastante". 
MAIS NOTÍCIAS DO CANAL