CINEMA

'Maria Callas', com Angelina Jolie, abre a 48ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

Longa de Pablo Larraín sobre a célebre cantora de ópera demonstra mais a vaidade com sua forma e beleza do que interesse genuíno pela personagem real

Publicado em: 17/10/2024 12:35

 (Divulgação)
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A 48ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, um dos eventos mais importantes do cinema no Brasil, teve sua cerimônia de abertura na última quarta-feira (16), na Sala São Paulo, com a exibição do aguardado Maria Callas, protagonizado por Angelina Jolie. O roteiro foca nos últimos dias de vida da célebre cantora de ópera greco-americana, na Paris de 1977, e acompanha seus devaneios e lembranças ao lado do mordomo (Pierfrancesco Favino) e da governanta (Valeria Golino).

A cantora soprano nascida em Nova York se tornou uma das mais célebres de todo o século, mas o final de sua vida foi marcada por um isolamento forte, após a morte do milionário Aristóteles Onassis, com quem viveu juntas após um breve namoro. Com uma rotina carregada de remédios e a voz definhando cada vez mais devido aos problemas de saúde, Maria tenta um retorno aos palcos mesmo contra a recomendação dos médicos. 

O diretor chileno Pablo Larraín tem as cinebiografias fabulares e contemplativas como marca registrada (Neruda, Jackie, Spencer, El Conde) e Maria Callas segue o mesmo caminho, buscando menos uma historicização objetiva e mais a captura de um estado de espírito - neste caso, de melancolia e morbidez. Enquanto esse método de idas e vindas na narrativa tinha um efeito poderoso no recorte da morte de Kennedy em Jackie e a contemplação sombria criava uma tensão crescente apropriadamente angustiante em Spencer, desta vez Larraín parece simplesmente reiterar esses maneirismos envaidecidos sem propor nada além do fetiche.

O sofrimento da personagem é, essencialmente, por perder aquilo de que toda a sua vida e adoração dependeram - sua voz. O ponto central da construção narrativa, portanto, é como essa dor coloca a protagonista em um estado de negação absoluta da falta de adoração. É um drama naturalmente algo impenetrável, mas que a abordagem da direção de fotografia aliada à interpretação ensimesmada de Angelina Jolie tornam ainda mais distanciado. Apesar da tentativa do texto de estabelecer as diferenças entre a 'Maria' (mulher) e a 'Callas' (diva), as cenas se acumulam como poses de um ensaio fotográfico sem jamais expor a humanidade daquelas figuras.

Maria parece sempre perfeitamente maquiada dentro do seu apartamento, se dirige a todos a sua volta (imaginados ou reais) como se estivesse declamando um texto irônico e toma os remédios escondida como se de fato estivesse sendo filmada. Essa artificialidade da condução de Larraín (respaldada por uma Jolie na sua investida mais radical para vencer seu segundo Oscar) impede a presença de arestas em Maria Callas, que, tal como sua atriz principal, demonstra menos o interesse real em conhecer e exteriorizar essa pessoa e mais em uma validação por parte da temporada de premiações.

Salvo pelas atuações de Pierfrancesco Favino e da governanta Valeria Golino, peões devotos da protagonista que a orbitam como rêmoras, o filme é um réquiem soprano para a voz de uma cantora da qual a plateia termina conhecendo menos do que quando entrou na sessão. Mais do que Maria ou do que Callas, o que se sobressai de fato no filme de Larraín são os olhares e posições ostentosos de Angelina Jolie.
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