CINEMA

'Não Fale o Mal', remake americano de terror dinamarquês, soa como resposta ao original

Filme protagonizado por James McAvoy e Mackenzie Davis preserva os temas e a tensão do filme de 2022 - até tomar um rumo próprio

Publicado em: 12/09/2024 06:00

 (Universal/Divulgação)
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Em viagem de férias pela Itália com a filha pequena, pai e mãe dinamarqueses fazem amizade com um extrovertido casal holandês, que, após algumas semanas, os convida para conhecer a casa deles em um vilarejo isolado na Holanda. A convivência exibe sinais de estranhamento desde o princípio, sobretudo pela forma como aquela estranha família trata o próprio filho, um menino totalmente mudo que parece querer passar alguma mensagem. O desconforto crescente com as atitudes invasivas, imprudentes e abruptamente agressivas dos anfitriões, no entanto, transforma o que parecia uma viagem pacata em um cenário de desespero, no qual as saídas parecem cada vez menores.

A descrição acima é o mote do muito comentado e controverso terror psicológico dinamarquês Speak no evil, de 2022, que acaba de ganhar a sua refilmagem norte-americana, Não fale o mal, em cartaz nos cinemas. Com a trama agora ambientada no interior da Inglaterra e o contraste cultural Dinamarca/Holanda trocado por diferenças (menos relevantes para a narrativa) entre americanos e ingleses, o roteiro segue, na maior parte, a exata estrutura de tensões e distensões do longa original; a cada marcha à ré, uma estranheza ainda maior pela frente.
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James McAvoy – que, após o sucesso de Fragmentado, é facilmente associável a vilões imprevisíveis – é a atuação de destaque aqui, no papel de Paddy, o perturbador do pai inglês que estica até o limite a permissividade dos hóspedes americanos e parece se divertir com a expressão de confusão dos mesmos. Aisling Franciosi, como Ciara, esposa de Paddy, se torna bem menos assustadora do que a personagem holandesa do filme de 2022, o que se deve mais às escolhas do roteiro do que ao trabalho da atriz. Já Mackenzie Davis ganha protagonismo e identificação da plateia como Louise, a mãe americana, que nota algo errado desde o começo naquele outro casal e parece sempre mais reativa às atitudes dos estranhos do que seu marido, Ben (Scott McNairy).

O diretor desta versão, James Watkins (A mulher de preto), embora não faça nada tão autêntico com a premissa, é bom artesão dessa gradação de situações incômodas e evita o caminho fácil de sustos falsos constantes que as refilmagens americanas costumam trilhar, apesar de nunca tornar a atmosfera tão pesada e desconfortável quanto no original. Não fale o mal preserva, sobretudo, o comentário central da história: essencialmente, ela trata de como o medo da desfeita, da ofensa e da quebra de códigos da educação pode ser, em alguns casos e culturas, até maior do que o instinto de autopreservação.
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A sacada de Watkins, que também escreveu a adaptação do roteiro, é fazer desta versão um curioso misto de reverência e carta de resposta ao longa dinamarquês. Se naquele primeiro filme esse tema da permissividade levava a história para uma crueldade indescritível, a qual soava demasiadamente manipulativa, este Não fale o mal acaba tomando um rumo bastante diferente a partir de um determinado ponto – o que pode diluir e ‘americanizar’ o impacto da fonte, mas, por outro lado, oferece uma recompensa mais satisfatória do ponto de vista do gênero. Alguns diriam, portanto, que este só existe porque alguém gostou tanto da ideia do outro que queria, a seu modo, ‘corrigi-lo’.

Dificilmente essa adaptação vai satisfazer os fãs da misantropia e do niilismo do anterior – e possivelmente aqueles que ficaram ultrajados com ele têm poucas razões para querer revisitá-lo pelo olhar norte-americano. Aos que não conheciam a história e buscam uma crescente de terror que desafia os limites da polidez num caso de sobrevivência, porém, Não fale o mal é uma boa oportunidade para ver as duas versões e observar como semelhanças e diferenças entre elas podem operar a favor ou contra o suspense, a depender da bagagem de cada espectador.

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