GUERRA

Biden autoriza Ucrânia a utilizar mísseis dos EUA contra a Rússia

A 65 dias de encerrar mandato, presidente americano permite ataque com armas de longo alcance ao território russo. Decisão ocorre horas depois de Moscou lançar um dos maiores bombardeios à infraestrutura ucraniana

Publicado em: 18/11/2024 07:38

Militares americanos realizam testes de lançamento do Sistema de Mísseis Táticos do Exército (ATACMS), no Novo México: arma pode ser usada por KIev  (Crédito: John Hamilton/Departamento da Defesa dos EUA/AFP)
Militares americanos realizam testes de lançamento do Sistema de Mísseis Táticos do Exército (ATACMS), no Novo México: arma pode ser usada por KIev (Crédito: John Hamilton/Departamento da Defesa dos EUA/AFP)

O presidente americano, Joe Biden, visitava Manaus, acompanhado da filha e da neta, quando a notícia urgente começou a estampar os sites e a chegar às redações de todo o mundo. A Casa Branca autorizou a Ucrânia a utilizar o poderoso Sistema de Mísseis Táticos do Exército (ATACMS, pela sigla em inglês) para atacar alvos dentro do território russo. Há mais de um ano, o governo de Volodymyr Zelensky buscava a permissão para lançar os mísseis terra-terra de longo alcance contra a Rússia. Sob condição de anonimato, fontes ligadas à Presidência dos Estados Unidos explicaram ao jornal The New York Times que a decisão de Biden foi uma resposta ao envio de cerca de 10 mil soldados da Coreia do Norte para a região de Kursk, no oeste da Rússia.

A medida teria caráter dissuasivo, a fim de demover o regime de Kim Jong-un de reforçar o apoio militar a Moscou. Também seria uma resposta ao fato de a Rússia ter lançado um dos maiores ataques contra a Ucrânia em 997 dias de guerra, com 120 mísseis e 90 drones suicidas. O principal alvo foi a infraestrutura energética. Onze pessoas morreram e 20 ficaram feridas. À noite, novo bombardeio russo deixou oito mortos, incluindo uma criança, em Sumi, no nordeste ucraniano. Em 65 dias, Biden entregará o poder para o republicano Donald Trump, que prometeu acabar com a guerra em 2025. 

País-membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e vizinho da Ucrânia, a Polônia celebrou a decisão de Washington. "Biden respondeu com uma linguagem que Vladimir Putin entende", afirmou o chanceler polonês, Radoslaw Sikorski, na rede social X, em alusão ao líder russo. Mais cedo, em visita a Buenos Aires, o presidente da França, Emmanuel Macron, disse que Putin "não quer a paz, nem está disposto a negociá-la". "Se precisamos saber quais são as intenções do senhor Putin, o que ele acabou de fazer no terreno mostra claramente."

Socorristas ucranianos carregam o corpo de civil morto em ataque com drone na cidade de Mykolaiv (sul) (Crédito: Serviço de Emergência Ucraniano/AFP)
Socorristas ucranianos carregam o corpo de civil morto em ataque com drone na cidade de Mykolaiv (sul) (Crédito: Serviço de Emergência Ucraniano/AFP)

"Chegou a hora de forçar a Rússia a pôr fim à guerra. Sou profundamente grato a todos os nossos parceiros que nos apoiam com sistemas de defesa aérea e mísseis. Este é um esforço verdadeiramente global", declarou Zelensky, em vídeo divulgado às 19h05 de ontem (hora de Brasília). "O plano para fortalecer a Ucrânia é o Plano da Vitória, que apresentei aos nossos parceiros. Um de seus pontos-chave são as capacidades de longo alcance para nosso exército. Hoje, há muita fala na mídia sobre termos recebido permissão para as respectivas ações. Ataques não são feitos com palavras. Tais coisas não foram anunciadas. Os mísseis falarão por si mesmos. E eles falarão."

"Terceira Guerra"

Até a noite deste domingo (17/11), Putin não tinha se pronunciado sobre o assunto. No entanto, Vladimir Dzhabarov, primeiro vice-chefe do Comitê de Assuntos Internacionais da Câmara Alta Russa, advertiu que a resposta de Moscou seria imediata. "Este é um grande passo em direção ao começo da Terceira Guerra Mundial", declarou à agência de notícias estatal Tass. 

Deputada do Verkhovna Rada (Parlamento da Ucrânia), Alyona Skhrum (leia o Depoimento) afirmou ao Correio que a autorização para uso do ATACMS era uma decisão "esperada há muito tempo". "É óbvio que se trata de uma ótima decisão. Esperamos que possa mudar o rumo da guerra e a nossa defesa", comentou. Ela não vê o risco de uma reação desmedida do presidente russo, Vladimir Putin. "Na verdade, todas as respostas da Rússia têm sido desproporcionais, desde bombardeios a jardins-da-infância e assassinatos de crianças usando armas químicas até um ecocídio e uma ameaça de ataque nuclear", comentou. 

Por telefone, a também deputada Lesia Vasykenko disse ao Correio que, a partir de agora, a Ucrânia conseguirá destruir muitas das fontes de ataque à Ucrânia, como os centros de comando da Rússia, aeroportos e bases aéreas. "Conseguiremos atingir esses alvos usando as mesmas táticas utilizadas pelos russos. Esperamos que, no curto prazo, isso represente menos bombardeios à infraestrutura ucraniana e aos civis. A longo prazo, esperamos uma mudança no front", declarou. 

Para Olexyi Haran, professor de política comparativa da Universidade Nacional de Kiev-Mohyla, a decisão da Casa Branca é "importante, apesar de tardia". "A questão é quanto mísseis temos dos EUA. A decisão poderia mudar a dinâmica do front e tornar a defesa ucraniana mais ativa e sólida", disse à reportagem. "Acho que Putin está blefando, e essa resposta americana deveria ter vindo bem antes. Sobre os riscos representados por essa medida, eu pergunto: 'Por quanto tempo mais os ucranianos devem ser mortos, incluindo civis?'. Depois da vitória de Trump nas eleições, a Rússia iniciou uma escalada na Ucrânia. Putin sabe que Trump terminará a guerra; por isso, quer estar em uma melhor posição para as negociações. A escalada está no reforço das tropas da Coreia do Norte e nos ataques à infraestrutura energética."

DEPOIMENTO

"Os russos aterrorizam os ucranianos"

"Tenho uma bebê de 10 meses. Fomos acordados, em nosso apartamento, no centro de Kiev, pelas explosões. Algumas foram tão fortes que as janelas começaram a tremer. Por volta das 6h deste domingo (1h em Brasília), nos refugiamos no banheiro, que funciona um pouco como um abrigo, e passamos parte da manhã lá. Mais tarde, descobri que, bem perto de nosso imóvel, partes de um drone russo caíram sobre um edifício residencial, que pegou fogo. Duas mulheres se feriram. O ataque também alvejou  a infraestrutura de eletricidade e de água. Uma parte de Kiev ficou sem abastecimento, sem energia e sem aquecimento. 

Estamos no inverno, e a temperatura pela manhã era de 1 grau Celsius. A Rússia atinge a a infraestrutura para que as pessoas fiquem sem aquecimento, sem eletricidade e sem água quente. Os russos aterrorizam os ucranianos, para que nos rendamos. Tentam atingir o máximo de alvos civis para trazer mais medo às pessoas — este ano bombardearam escolas, jardins-de-infância e o maior hospital infantil da Ucrânia, no qual minha filha fez um checape. Basicamente, Putin envia a mensagem: a Ucrânia será parte da Rússia ou vocês não terão uma vida normal."
 
As informações são do Correio Braziliense. 
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